Desigualdade

A piscina estava rodeada de areia e nela se juntaram centenas de corpos nus mergulhados no forte sol de verão. Um homem bem vestido boiava na água. Era o proprietário da casa – uma enorme mansão – e estava morto. No final do dia o homem tinha vagueado pelos extremos da piscina sem que ninguém se importasse. As pessoas foram para casa e voltaram à piscina pelo menos mais cinco dias até aparecer a polícia. O interrogatório demorou horas. Até que um polícia desconfiou de suicídio assistido – que outra razão podia tornar aquelas pessoas tão indiferentes à morte de um amigo? Outra hipótese foi não o terem visto, simplesmente – muito embora o volume do corpo inchado não o tornasse propriamente invisível. A última explicação, a mais provável, foi que todos desejavam vê-lo morto e todos celebrariam infinitamente a sua morte se fosse possível – por isso o mataram e ali ficaram.
Ao contrário do que se pensou estavam a vê-lo e até lhe devem ter mexido – deslocaram-no para que o sol não o queimasse, porque não queriam vê-lo muito deteriorado. “Sente-se culpada?” – perguntou um dos polícias à esposa. “Dada a situação, observe e diga-me, quem é que tem culpa? Estas centenas de pessoas ou o meu marido?”