ISQUEIRO receptor de mensagens internacionai

No domingo à noite encontrava-se completamente esgotada por se ter esforçado tanto para se distrair do facto de estar sozinha. Achou melhor telefonar-lhe - mesmo que soubesse que não iria ser bem recebida. Levantou o auscultador e esperou que desse o sinal, depois marcou o número que sabia de cor, rodando o disco com o indicador. Encostou-se à parede e deslizou até ao chão, esperando que C a atendesse. Não houve resposta do outro lado da linha.

Arrastou-se então com o telefone puxando a linha até ao sofá. Pousou-o na mesa e voltou a tentar, rodando o indicador com um ritmo regular, como se fosse possível ser responsável por um gesto impessoal. C atendeu de imediato – “então, como estás?”
Ela foi apanhada de surpresa – estava na realidade completamente rendida ao facto de estar sozinha há horas, dias.
- “Estou bem, queria saber como está o pequeno H?”
- “Está bem, adapta-se às alterações que as nossas vidas sofrerão...”
- “Sim, ainda bem, obrigada!”
- “Até breve, ...”
Terminando a chamada C pousa o telefone. Estava transtornado e corre em direcção a P e a H e comenta-lhes:
- “É insuportável ouvi-la, zzzzxxx, espero que não pense em voltar atrás, zzzzxxxx, não há espaço para ela, zzzzzzzzxxxxxxxxxxxx, não é mais possível mantê-la...

O telefone não estava pousado e o som entrou nos orifícios a toda a velocidade e atravessou a extensa geografia que os separava. Do lado de cá da linha, com o telefone desligado, sentada no sofá, ela ouviu tudo a ser transmitido, não pelo telefone que de facto ela tinha desligado, mas do isqueiro! O metal de que era feito, era um verdadeiro transmissor sonoro. Ficou arrasada – não com a mensagem, mas com o fenómeno que se estava a passar. Agarrou-se ao isqueiro para interceptar sons, como se fosse um rádio. Não se sentia menos sozinha, mas pelo menos estava mais ocupada.