A vida virtual dos animais embalsamados

Uma avestruz, à janela, tira o seu chapéu a quem passa na rua. Estava embalsama há uns anos e disponível para visita das dez da manhã ás sei da tarde. À hora certa abria-se a janela e ela lá lá estava. Sofria de entorces por não poder dobrar o pescoço de vez em quando para o enfiar na terra. No entanto os musculos e penas das asas, de tanto retirar e pôr chapéu, gastavam-se mas em nada melhoravam. O rítmo contínuo, a actividade regular era mecânica. Valia-se contudo de uma habilidade de comunicar com sons inaudiveis com o mundo dos embalsamados. Este é um mundo que existe numa dimensão oculta (entre muitas) e que se desenvolveu entre as multidões de animais que insistem em não largar os seus corpos mesmo depois da transformação que sofrem. Embora aborecidissima da sua vida, o que vemos dela se espreitarmos pela janela, a avestruz estava contente e tinha até um namorado lagarto que morava dois andares acima.