FAROL

Há mais de vinte anos que vivia isolado numa ilha não identificada em nenhum mapa ilustrativo da região, tendo por companhia uma velha pedra castanha, bastante polida, que ele guardava embrulhada na palma da mão.
Existiam animais, plantas, e outros seres vivos não classificados como pertencentes a uma ou outro espécie, mas este homem escolhera uma pedra para conviver e mais nenhum outro.

Quando foi encontrado por um barco de pesca que, fugindo da rota oficialmente traçada, e acidentado por uma tempestade não prevista, foi ancorar ali numa das margens da ilha, pediu aos seus tripulantes que o levassem. Assim aconteceu.

Durante a viagem, a meio da trajectória, do caminho de volta, o homem abre a mão e diz à pedra “vamos ver a Europa, um pão, um copo,...”. A pedra estava vermelha da temperatura tão elevada da palma da mão e imanava um luz singular. Os pescadores olhavam o homem como se desconfiassem pela primeira vez dele e atreveram-se a perguntar a razão de ser da pedra. O homem sentiu-se intimidado e com enorme resistência respondeu: saí da civilização com um fim e esse não seria cumprido senão em diálogo com esta pedra que imana a luz da minha própria presença.

Laçaram-no ao mar, não por discordarem, porque não ousariam fazê-lo, mas por medo das palavras do desconhecido que não representavam nada de concreto. O homem estendeu-se de barriga para cima com a pedra ao peito e tornou-se num farol.