Emparedada Viva

Em 1910 comprei num atelier localizado numa cave parisiense o mais belo quadro abstracto. O meu marido que estava comigo na altura da compra, interpretava o quadro e a compra de um modo muito diferente de mim. Ele achava que a compra tinha sido um capricho patético, uma forma de eu me integrar, não sem me sobrepor, à cultura da rua e principalmente aos artistas que ele achava piores em qualidade. Ora, na opinião dele eu estava a fazer-lhe frente, a contrariá-lo, porque vivia centrado nele próprio como mais ninguém que eu tenha conhecido.

Quando um dia decido tirá-lo do embrulho e afixá-lo na parede, o meu marido comunica-me que se sente traído, e esta será uma prova de como o tenho rebaixado publicamente.

Naturalmente que desconhecia a força da sua raiva e a vontade de me impedir de expor os meus sentimentos mais íntimos pela Arte e por aquele quadro. Decidi fazer-lhe frente e peguei num martelo e encostei-me à parede.