Olhos da verdade

Na sessão daquele dia o reverendo estava mais excitado que o costume. A cara suada com gotas a brotar dos poros espalhadas tão uniformemente que parecia uma laranja. E os olhos assustadoramente esbugalhados, quase que prometiam que o homem fosse ficar cego.
Haveria certamente algum novo crente com a família ou um novo truque para apresentar.

Começou por contar os dramas dos outros, verdadeiros ou inventados, na excitação do costume. Depois voltou-se para as verdades do Senhor ditas através de frases curtas que ou entravam nos ouvidos como ordens ou rodopiavam e perdiam o sentido.

O reverendo chamou-me e eu, sua assistente de confiança, respondi-lhe como era suposto com um grito forte e prolongado, quase me levando ao desmaio, e dirigi-me ao palco. Curar-me-ia de uma dor aguda no peito. O reverendo abraçou-me fortemente, agarrou-se ao meu tórax e disse – “Vai, serás feliz e saudável outra vez...”. Em agradecimento e tal como ensaiado saltei de alegria, mas por vez de o apanhar de frente, usei as suas costas. Estava prestes a desequilibrar-me e segurei-me ainda com mais força entre o pescoço e a cabeça. Saltaram-lhe os olhos que rolaram até à multidão desvairada, em profundo delírio incapaz de ver o que quer que fosse. Os olhos foram chutados para longe para perto de um cego ao qual chegaram intactos. E uma pomba voo fazendo parecer que algo realmente verdadeiro tinha acontecido ali.