Motivo

Naquela madrugada, do grupo que seguia na caminhada organizada pela enfermeira voluntaria Sra. K, energética e bem disposta, separaram-se dois rapazes que se distraíram com um mocho que ainda não se tinha retirado. Os dois companheiros caminhavam sem pressa, pois não estavam habituados a acordar àquelas horas e mantinham-se bastante sonolentos, e aos poucos esqueceram-se do animal que seguiam. A diferença de idade entre eles e o restante grupo era grande e por isso não era de estranhar que se se sentissem aborrecidos. Estavam ali porque eram os netos órfãos do Sr. W que não tinha onde os deixar.

Quando perderam de vista todos os conhecidos sentaram-se num grande rochedo revestido de musgo. Foi então que se soltou o sangue a Edgar, o mais novo, que, em estado de grande aflição, agarrou numa folha amarela, molhada do orvalho, e a levou ao nariz. Foi então que os dois perceberam que o sangue não era tão fino e liso como tinham imaginado – saía como uma fita de amarrar o cabelo das raparigas. Talvez nunca tivessem visto sangue antes, concluíram. A discussão que tiveram à volta deste assunto levou-os à morte, a matarem-se um ao outro por asfixia derivada de estrangulamento. Talvez se possa pensar que o motivo não era suficientemente forte, mas para as duas crianças foi.