Silêncio

Um peregrino seguia pela margem de uma estrada alcatroada. Era talvez um homem, pelo recorte do corpo, largo nos ombros, estreito na cintura. Vestia-se totalmente de preto e tinha a cabeça coberta de um lenço da mesma cor. À noite, este peregrino era invisível.

Quando foi visto certa noite, através dos faróis de nevoeiro de um carro, tapou a cara com as mãos e encolheu-se aos poucos até se reduzir a uma espécie de bola de pano. Quando dois homens saíram do carro e lhe perguntaram com simpatia quem era e para onde ia, e se precisava de ajuda, o peregrino gritou um som horrível. Os homens, após muitas tentativas, perderam a paciência e empurraram-no. Empurraram-no várias vezes, até começarem a esmurrá-lo com força em todas as partes do corpo aleatoriamente.

Quando a bola de pano ficou molhada de sangue, os homens desistiram e deixaram-no em paz. Assim ficou imóvel, aquela bola que tinha agora como mancha de sombra um tapete vermelho de sangue. Quando a população da aldeia onde se encontrava acordou e viu aquela bola negra destaparam-no e viram um corpo nu, de um homem, certamente peregrino, que fizera votos de pobreza e de simplicidade absoluta. Conseguiram acordá-lo e pegando-lhe pelas axilas levaram-no até a um quarto para o tratarem. Ao recuperar os sentidos o homem mostrou-lhes o silêncio.